Sinopse:
Liam Digby era um garoto comum de doze anos. Um garoto comum de doze anos muito, muito, muito alto. Algumas pessoas até achavam que ele era um adulto. Esta é a incrível historia de como Liam contou algumas mentirinhas, quase roubou um Porsche, visitou um parque de diversões e meio que acidentalmente foi parar no espaço.
Este é um juvenil com o título Cósmico e um astronauta fofinho na capa. Portanto, não preciso explicar por que o comprei. Confesso que a sinopse me deixou um pouco apreensiva, pois histórias tão malucas assim tendem a funcionar muito bem ou muito mal. Mas, neste caso, a trama é ótima e o livro me surpreendeu de uma forma muito positiva.
Liam Digby é um garoto de doze anos tão alto, mas tão alto que, quando sua barba começa a nascer, as pessoas começam a confundi-lo com um adulto. E é claro que o garoto, para testar seus limites − e os limites da zoeira − não tenta desfazer esses enganos, e acaba se metendo em situações cômicas e até perigosas.
A maior das confusões acontece quando ele e sua amiga Flórida (que muitas vezes se passa por sua filha, embora eles tenham a mesma idade) são selecionados para um programa especial que vai levar quatro pais e seus filhos para conhecer um inédito parque temático na China. Quando chegam ao país, são recebidos pela dra. Drax, dona de uma multimilionária empresa de tecnologia, que idealizou e criou o parque, cujo tema é viagem espacial. Mas o intuito do lugar não é apenas divertir crianças, mas treinar pequenos astronautas − os brinquedos são simuladores de variação de gravidade e reentrada na atmosfera, e a atração principal é um foguete de verdade, que vai para o espaço de verdade. (Porque sim, esse é o tipo de lugar que adultos criam.)
Porém, nesta primeira viagem, apenas um adulto vai acompanhar as crianças. Então, a dra. Drax dá início a uma competição para definir quem é o melhor pai. (Porque sim, esse é o jeito como adultos selecionam gente apta a viajar em um foguete.)
É claro que Liam não tem qualquer experiência em ser pai − muito menos em ser adulto − mas ninguém desconfia disso, embora às vezes o acusem de agir de forma infantil. Os outros pais, porém, também não são exemplares. Em uma estrutura muito parecida com a de A fantástica fábrica de chocolates (falo do filme de 2005, pois infelizmente ainda não li o livro), somos apresentados a três pais competitivos e até opressores, cujos filhos foram educados para vencer, calcular e subornar. Nenhum deles aprecia de verdade a oportunidade que os filhos terão de viajar ao espaço: estão apenas interessados na visibilidade e nas oportunidades que isso trará aos garotos.
Ao longo da competição, Liam, que conta a história em primeira pessoa, percebe as falhas que cada um dos pais comete com seu filho. Com a visão fofa e um tanto inocente de uma criança, e com uma narrativa bem-humorada e cômica (que, em algumas cenas, me fez rir alto), Liam reflete sobre essas relações e sobre a vida e as responsabilidades de um adulto. Mesmo tendo como referência seu ponto de vista infantil (cheio de comparações do mundo com World of Warcraft e de definições engraçadinhas de como agem os pais), não consegui não o enxergar como um garoto muito perspicaz, e os outros como crianças em todos os sentidos − apesar das imposições feitas pelo mundo e pelos pais, aqueles garotos arrogantes são apenas menininhos super carentes, que acabam cativando o leitor e não são condenados, como acontece na fábrica de Willy Wonka. Destaque para Flórida, uma garota a princípio irritante e de comportamento totalmente imprevisível, mas que evolui tanto quanto Liam (ou até mais) ao longo da trama.
Desde a primeira página do livro, sabemos que quem vai ao espaço com as crianças é Liam, e que algo dá muito errado lá em cima. Mesmo assim, fica a expectativa de saber como ele consegue e o que acontece lá em cima. A parte final do livro, que se passa dentro do foguete, atende as expectativas, é divertida e bem escrita − mas sou suspeita pra falar, porque sempre me fascino com descrições do espaço, da vista e da sensação de estar por lá.
A edição da Seguinte está bem bonitinha e agradável de ler, embora eu confesse que a quarta capa, cujo texto imita a abertura de Star Wars, me fez torcer o nariz. Star Wars não é mencionado no livro (ao menos não de forma relevante) e a única relação entre os filmes e este livro é que ambos se passam no espaço. Ou seja, foi uma escolha bem injustificada, que pode enganar o leitor.
Muito engraçado e meigo, e com reflexões bem-humoradas e pertinentes, Cósmico tem morais fofas e é não apenas uma reflexão sobre paternidade como uma homenagem aos pais.
Cósmico
Autor: Frank Cottrell Boyce
Tradutor: Antônio Xerxenesky
Editora: Seguinte
Ano desta edição: 2012
336 páginas
Citações favoritas
É assim que funcionam os pais. Se você desaparece, eles ficam preocupados e acham que pode estar morto. Quando encontram você, querem te matar.
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Sabe o que é o Banco Imobiliário? É a minha vida. Andar em círculos, passando sempre pelas mesmas ruas, sem nunca ter dinheiro o bastante.
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Descobri que ser pai é um esporte competitivo.
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A vida adulta deveria ser mais divertida. […] Qual é a graça de abandonar a infância se tudo que você recebe em troca são formulários para preencher?