Sinopse:
Na terrível e eterna Era do Gelo, a sobrevivência humana parece impossível. Porém, cruzando as infinitas terras devastadas, o último bastião da humanidade segue, imparável, sobre os trilhos: o Perfuraneve. Esse trem fantástico, de tecnologia revolucionária, é capaz de cruzar a Terra eternamente em moto-contínuo, abrigando os últimos representantes da espécie humana. O que seria a salvação do homem, no entanto, torna-se com o tempo uma cruel reprodução dos bons e velhos mecanismos que levaram o planeta à destruição.
Fonte: Aleph
Apocalipse, distopia e trens. Aí estão três assuntos respeitáveis. Tão respeitáveis que, assim que ouvi falar da HQ O Perfuraneve, soube que precisava lê-la.
Desde a premissa, a obra já me prendeu: após um grande cataclisma, a Terra é acometida por uma nova Era do Gelo, e o último refúgio para os sobreviventes é uma locomotiva de mil e um vagões. O Perfuraneve, um trem de movimento perpétuo, é então transformado num microcosmo da nossa sociedade. Uma divisão social opressora e inflexível é imposta aos tripulantes, e os vagões de trás são destinados às pessoas sem nenhum direito. Miseráveis, eles não têm sequer comunicação com o resto do trem.
Quando um dos “fundistas”, chamado Proloff, consegue fugir para o setor seguinte, o governo fica alarmado com uma possível ameaça à ordem vigente. Uma associação de defesa dos direitos dos fundistas envia uma de suas integrantes, Adeline Belleau, para se encontrar com Proloff e convidá-lo a ajudar a missão da associação.
Essa é a trama de O Perfuraneve, publicado em 1984 (que data simbólica!). Quinze anos depois, a HQ ganhou duas continuações: O explorador e A travessia, que juntos integram esta edição.
Confesso que o primeiro volume não me agradou muito. A ideia, como já mencionei, é fantástica. Mas achei que a execução pareceu apressada. Ao longo de sua fuga dos governantes e da polícia, Proloff atravessa todos os vagões até chegar à frente do Perfuraneve. Sua viagem mostra alguns aspectos do funcionamento do trem e de sua sociedade, mas é tudo muito rápido. É uma história introdutória, feita para apresentar um mundo e uma visão bem pessoal do protagonista sobre os horrores de fazer parte dele. Nenhum assunto é aprofundado, e às vezes um quadrinho apresenta uma questão importante apenas para, no quadrinho seguinte, o assunto ser deixado de lado. A sensação é exatamente a de se passar correndo pelo trem sem entender direito o que está acontecendo (que é, na verdade, o que o protagonista faz).
Minha parte favorita nesse volume é quando o protagonista conta uma história dos superlotados vagões do fundo, sobre um homem cujo pedido de aniversário foi que o deixassem sozinho durante uma hora. A história é impactante e me deixou curiosa para saber mais sobre a vida das outras pessoas no trem. O que almejam? Com que sonham? Por que a bela e ousada Adeline (aparentemente a única mulher que não está se prostituindo) se envolve num romance tão gratuito com o protagonista?
Para compensar, os volumes seguintes foram muito bons. Assim como o primeiro volume, também apresentam (além de um protagonista que ameaça a ordem social vigente) o microcosmo do trem à beira de uma grande crise causada por motivos não políticos. Na primeira história, a causa da crise era a alarmante desaceleração do trem. Não vou revelar muito da trama dos volumes seguintes para não para não dar spoilers (revelações bombásticas são feitas desde a primeira página de O explorador, o segundo volume), mas posso dizer que, além da crise de origem externa, ambos contam a história de Puig Vallès, um homem cuja curiosidade o torna uma ameaça ao sistema. Diferente de Proloff, que não tem pretensões heroicas (o coitado só quer se afastar o máximo possível dos vagões do fundo!), Puig questiona as mentiras contadas por seus líderes e tenta mudar o destino das pessoas no trem.
Produzidos mais de uma década depois (e por outro roteirista, após a morte de Jacques Lob), esses volumes têm uma arte bem diferente do primeiro, menos detalhada e com traços mais delicados, e a leitura flui mais fácil, pois a articulação entre um quadrinho e outro parece mais bem estruturada. A história também traz mais detalhes sobre a sociedade do trem. A religião volta a ser aprofundada e o entretenimento, que no primeiro volume se limitava ao sexo, também fica diferente. Nas continuações, conhecemos um sistema mais estruturado de diversão e controle das massas, que inclui transmissões televisivas e uma loteria de viagens virtuais.
Além disso, as tramas políticas estão mais complexas, compondo uma história empolgante com grandes reviravoltas e conspirações. Mas o mais interessante sobre a HQ não é a ação nem as intrigas, e sim as revelações maiores, sobre os segredos ocultos pelo governo. (Fiquem curiosos, não vou falar.)
A edição completa de O perfuraneve é bem grande, mas as histórias são tão dinâmicas que cada uma acaba sendo uma leitura sem interrupção. Ou seja, dá para separar entre um e três dias para a HQ, e depois correr pro cinema ver a adaptação com o lindo do Chris Evans – que eu ainda não assisti, mas as expectativas são altas!
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O perfuraneve
Autores: Jacques Lob, Jean-Marc Rochette, Benjamin Legrand
Tradutor: Daniel Lühman
Editora: Aleph
Ano de publicação: 1984-1999-2000
Ano desta edição: 2015
280 páginas
Oi Bárbara!
Não tenho o hábito de ler HQs, nem conhecia essa série. Pelos seus comentários parece mesmo uma proposta interessante (pela sinopse não havia achado).
Que bom que os outros volumes foram melhores que o primeiro, mas acho normal que o primeiro seja mesmo só uma introdução.
Beijos,
alemdacontracapa.blogspot.com
Namoro esse quadrinho há bom tempo, acho essa capa linda. Mas né, como dinheiro não dá em árvore fico só namorando de longe (não só ele, como muitos outros…)
Beijos, Babs!
http://www.ummetroemeiodelivros.com