[Resenha] Carry on

Esta resenha foi feita com base no e-book da St. Martin’s Press. A tradução de trechos foi feita por mim.

carryonSinopse:

Simon Snow é um bruxo que estuda numa escola de magia na Inglaterra. Profecias dizem que ele é o Escolhido. Você pode até estar pensando que já conhece uma história parecida. O que você não sabe é que Simon Snow é o pior escolhido que alguém já escolheu.

Poderosíssimo, mas desastroso a ponto de não conseguir controlar sequer sua própria varinha, Simon está tendo um ano difícil na Escola de Magia de Watford. Seu mentor o evita, sua namorada termina com ele e uma entidade sinistra ronda por aí usando seu rosto. Para piorar, seu antagonista e colega de quarto, Baz, está desaparecido, provavelmente maquinando algum plano insano a fim de derrotá-lo.

Fonte: Livraria Cultura

Simon Snow é o Escolhido: aos 11 anos, o Mago – diretor da Escola de Magia Watford – o tirou de seu lar adotivo e lhe contou que era a pessoa mais poderosa do mundo, destinada a derrotar um inimigo que estava drenando a magia em certos lugares da Terra. Simon vai para a escola, onde conhece a melhor amiga Penelope (uma garota extremamente inteligente), a namorada Agatha e o arqui-inimigo (e colega de quarto) Baz, filho de uma das famílias mais tradicionais e ricas do mundo mágico – e quem Simon jura ser um vampiro.

Mas espere! Não corra ainda. A autora Rainbow Rowell obviamente modela a premissa de sua história em outra saga sobre um menino bruxo, mas o faz descarada e propositadamente – usando o conhecimento que o leitor tem de Harry Potter para jogá-lo de cara na história, então brincando com as suas expectativas, subvertendo tudo que achava que sabia sobre esses personagens. Os momentos de “quebra” com o roteiro são deliciosos, assim como as referências a Harry Potter são muitas vezes hilárias: como quando Simon, que começa a história no último ano de escola, lembra de todos os inimigos com quem batalhou no final dos anos letivos anteriores, ou quando narra sua obsessão em seguir todos os passos de Baz, que ele jura estar tramando coisas terríveis.

De fato, o livro é meio homenagem, meio zoação do bem com Harry Potter: por exemplo, os alunos de Watford não vivem na mordomia, e os bruxos habitam entre os humanos, usam celulares e computadores, e vivem fazendo referências à cultura pop. E não por acaso: o sistema de magia baseia-se em palavras e frases recorrentes, que por seu uso constante ganham poder, e por isso eles precisam estar entre os “Normais”. Achei o sistema super diferente: os feitiços são poemas, ditados e coisas do tipo; e eles usam o nome de artistas ou compositores (ou, em um momento, Chomsky) como interjeições, o que achei hilário. E esse é o único livro de fantasia que já li na vida em que existem psicólogos mágicos, o que eu sempre achei bem necessário para o protagonista traumatizado e quis ver numa história. Ponto pra autora!

Mas o que torna esse livro realmente especial é como ele é representativo da cultura de fãs que se popularizou com e após Harry Potter: uma legião de pessoas que produzem conteúdo, têm senso crítico, e valorizam a diversidade. (A história de Simon aparece num livro anterior de Rowell, Fangirl, em que uma menina escreve fanfics sobre Simon e Baz, uma piscadela nada sutil aos fãs de um dos maiores ships potterianos. Mas eu não li Fangirl e ele não é nem um pouco necessário para entender Carry on.)

Temos um romance LGBT ca-nô-ni-co e super bem desenvolvido, tão fofo que às vezes eu só me jogava no chão e saía rolando pela casa, sem conseguir suportar tanto amor pelos personagens. Eles lidam com questões de sexualidade (como “oh, será que eu sou gay? Por essa eu não esperava (apesar de todos os sinais)!”) e a autora reconhece a homofobia existente em nossa realidade, mas isso não é exagerado nem sobrepuja a preocupação com a trama maior do livro, que envolve a investigação da morte da mãe de Baz e os “buracos” sem magia que ameaçam os bruxos.

Baz, preciso dizer, é maravilhoso – faz (e fez) coisas questionáveis, mas impelido pela pressão familiar e por um segredo pessoal que formou toda a sua personalidade sarcástica e defensiva. Simon também é uma graça, genuinamente bom e carinhoso, embora às vezes me irritasse com suas desconfianças (se bem que ele tinha bons motivos pra isso, admito).

As personagens femininas são incrivelmente bem desenvolvidas. Penelope é incrível: sarcástica e inteligente, mas não a chata que quer conter os meninos. Pelo contrário, é ela quem quebra as regras, para desespero de Simon. A amizade totalmente não romântica dos dois também é uma delícia de ler. E Agatha não está lá só pra ser a namorada sem personalidade: tem o dilema próprio de gostar mais do mundo dos Normais do que o dos bruxos e não quer ser o “prêmio” de Simon para quando ele sobreviver ao inimigo, mas sim ter um romance que a arrebate agora. Ela toma decisões difíceis e corajosas ao longo do livro e parece uma garota incrivelmente real. Só achei que merecia mais resolução até o fim do livro, ou pelo menos receber um pedido de desculpas.

A narrativa é feita em primeira pessoa pelos quatro principais e alguns outros, e a leitura voa depois das primeiras páginas (li o livro em dois dias, só parando pra dormir). Os diálogos entre os quatro principais são divertidíssimos e me fizeram rir várias vezes. A trama é bem construída, mas o ritmo às vezes foi um pouco acelerado demais para mim, especialmente no final, mas nada que mereça uma crítica muito grande. Adorei a jornada e torço muito para que haja uma continuação. É um livro fascinante porque não poderia existir sem Harry Potter, mas chamá-lo de paródia ou fanfic é menosprezar a criação da autora, que nos traz um mundo e personagens tão especiais. Recomendadíssimo para fãs de YA, romances, bruxos, personagens LGBT e calças jeans apertadas (trust me).

*

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Carry on
Autora: Rainbow Rowell
Tradutora: Marcia Men
Editora: Novo Século
Ano de publicação: 2016
480 páginas

 

Citações preferidas

“Minha mãe disse que ninguém realmente sabia de onde você veio. E que você podia ser perigoso.”

“Por que não ouviu ela?”

“Porque ninguém sabia de onde você veio, Simon! E você podia ser perigoso!”

*

A primeira vez que eu voltei para Watford, no meu segundo ano, eu fui direto para a minha cama e chorei como um bebê. Ainda estava chorando quando Baz entrou. “Por que você já está choramingando?” ele rosnou. “Está estragando meus planos de te levar às lágrimas.”

*

“Há um número finito de horas no dia, Simon. Cada um de nós só tem tempo de lidar com, no máximo, duas ou três pessoas.”

“Há mais pessoas que isso na sua família imediata, Penny.”

“Eu sei. É uma luta.”

*

Bem quando você pensa que está numa cena sem Simon, ele aparece para te lembrar que todo mundo é um personagem coadjuvante na catástrofe dele.

*

“É bom ver vocês garotas passando tempo juntas,” ela diz. “É bom ter uma vida que passa no teste de Bechdel.”

*

Eu deveria ter considerado toda a dinâmica do triângulo amoroso deles antes de arrastar Agatha para a casa de Baz. Mas a dinâmica do triângulo amoroso deles é tão persistentemente estúpida que não posso ser culpada por bloqueá-la da mente.

*

Há livros por todo canto, em pilhas e abertos. Há páginas arrancadas e coladas sobre uma parede inteira. (Não coladas – grudadas à parede com feitiços.) (E isso é exatamente o tipo de coisa que não aguento mais. Tipo, só use fita adesiva. Por que inventar um feitiço para grudar papel na parede? Fita. Adesiva. Existe.)

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6 respostas em “[Resenha] Carry on

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