Sinopse:
Na pequena cidade de Ealing, Iowa, Austin e seu melhor amigo, Robby, libertam acidentalmente um exército incontrolável. São louva-a-deus de um metro e oitenta de altura, completamente tarados e famintos. Essa é a verdade. Essa é a história. É o fim do mundo e ninguém sabe o que fazer.
Fonte: Skoob
Selva de gafanhotos é um livro muito louco. Perdoem a informalidade, mas esse é o primeiro e mais sucinto comentário que eu tenho a fazer sobre a obra.
Um garoto de 16 anos chamado Austin, que vive na cidadezinha de Ealing, em Iowa, nos conta uma história surreal. Ela envolve os dramas românticos da sua juventude e se desenvolve paralelamente a uma das tramas de ficção científica mais trash da história.
Austin está apaixonado por sua namorada, Shann Collins, e também por seu melhor amigo, Robby Brees. Isso deixa o garoto muito confuso e indeciso. Até aí, poderia ser um YA qualquer com triângulo amoroso, como muitos outros. Mas a abordagem do romance é bem diferente. Pra começar, Austin não fala apenas sobre amor. Ele vive com tesão, e faz questão de informar isso ao leitor. Além disso, seus sentimentos não são melosos e dramáticos. Soam bem legítimos, sim, mas principalmente porque os desabafos ao leitor soam como as coisas que um garoto de sua idade realmente diria. As questões de identidade sexual pelas quais Austin está passando não são diminuídas – pelo contrário, a abordagem das confusões de um personagem bissexual é muito bem feita –, mas também não são tratadas de um jeito fofinho e didático, muito menos bonito. Nada de poesia por aqui!
Aliás, o estilo da narrativa é peculiar. As frases são truncadas de propósito, e muitas informações são exaustivamente repetidas e retomadas. Isso acontece porque Austin enxerga relações entre absolutamente tudo o que acontece à sua volta, e vai linkando as histórias de seus antepassados, os acontecimentos atuais, a vida de estranhos e até datas históricas irrelevantes, de uma forma bem impressionante. Em determinado trecho, sua namorada define muito bem o jeito como ele fala:
Amo o jeito como você conta histórias. Amo o modo como, sempre que conta uma história, você vai para a frente e para trás e me conta tudo o que poderia estar acontecendo em todas as direções, como uma explosão. Como uma flor desabrochando.
Esse trecho, na verdade, me pareceu bem forçado. É desnecessário ao resto da trama, e o autor está claramente explicando o próprio estilo, demonstrando subestimar o leitor. Mas isso foi uma exceção – o resto do livro é escrito de um modo inteligente e, apesar de a leitura ter ficado um pouco cansativa perto do final, a narrativa é inovadora e muito criativa.
A parte de ficção científica da história me pegou totalmente de surpresa, por isso não vou revelar detalhes. Digo apenas que envolve um cientista maluco, conspirações políticas e monstros. É tudo muito surreal e ao mesmo tempo bem divertido de ler – se, é claro, você souber se entregar a tramas que têm insetos gigantes e o fim do mundo. Tudo isso é apresentado sob o ponto de vista anestésico do narrador, que não prepara o leitor para as reviravoltas e revelações mais chocantes da trama. Ele narra esses acontecimentos com o mesmo tom de naturalidade com que fala dos outros, o que cria um efeito bem interessante e choca o leitor ainda mais do que se o autor tivesse escolhido uma narrativa mais tradicional, que exalta e prepara certo suspense em torno dos fatos mais relevantes.
A quebra de expectativas é muito presente em Selva de gafanhotos, em um estilo que muitas vezes parece zombar de outras obras do gênero (mais ou menos como feito em Me and Earl and the Dying Girl). Além da falta de resolução de certos conflitos – estratégia um tanto ousada da parte do autor, mas que combinou bastante com a trama – os personagens também não são nada tradicionais. Os protagonistas não têm atitudes heroicas e, diante do fim do mundo, se comportam exatamente como adolescentes bem bobos se comportariam – diferente de personagens de outras obras, que parecem amadurecer rápido demais, em momento algum Austin é atingido por um grande senso de dever que o faz esquecer de seus interesses mundanos e seus estímulos hormonais.
A história, quando contada com honestidade, mostra que os garotos na verdade nunca fazem declarações heroicas enquanto estão no meio de uma batalha. Os historiadores tomam uma licença poética ao inserir essas coisas quando escrevem sobre o evento.
A paixão de Austin por história também é bem marcante. O garoto tem uma visão muito peculiar sobre o que é história, e registra tudo à sua volta como se ele próprio fosse um historiador, nos fazendo questionar o que, de fato, merece ser classificado como relevante e registrado para a posteridade.
Resultado dessa mescla de assuntos aleatórios e bem peculiares, Selva de gafanhotos é uma obra muito criativa, e com uma boa história. Recomendo pra quem quer ler algo bem diferente e não liga – e até aprecia – um pouco de esquisitice.
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Selva de gafanhotos
Autor: Andrew Smith
Editora: Intrínseca
Ano de publicação: 2015
350 páginas
Livro cedido em parceria com a Intrínseca.
Citações favoritas
Sabe, se dessem um Prêmio Nobel pela habilidade de não trabalhar, todo ano algum cara branco de Iowa ganharia um milhão de dólares e uma viagem para a Suécia.
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– Você acha que eu sou gay, Rob? – perguntei.
– Não me importo se você for gay – disse Rob. – Gay é só uma palavra. Como laranja. Eu sei quem você é. Não há um rótulo para isso.
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Lição de história: ao longo dos séculos na história da educação, apesar do esforço corajoso de intermináveis exércitos de pedagogos, a tentativa de deixar os adolescentes com medo de sexo se revelou uma batalha perdida.
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Amo tanto Shann Collins que tenho medo de que isso esteja me matando.
Amo Robby Brees com a mesma intensidade.
Sou um desastre de trem irrefreável na vida deles.
Caramba, que diferente! Li muito bem sobre esse livros em alguns blogs americanos, agor fiquei com mais vontade ainda de ler.
livro* agora* (aff, digitando no cel.)
É uma loucura só, Brenda. Não parece com mais nada que eu já tenha lido, e valeu muito a pena!
Oi Barbara!
Esse é mesmo um livro bem peculiar. Uma das coisas que eu mais gostei foi essa narrativa quebrada e repetitiva porque me senti dentro da cabeça do protagonista. A história em si não me marcou muito, mas adorei a maneira como o autor explorou o triângulo amoroso e o desfecho que deu a ele.
Beijos,
alemdacontracapa.blogspot.com
Mari, a narrativa quebrada e repetitiva me dividiu: ela é um pouco cansativa, mas ao mesmo tempo me deixava muito curiosa para descobrir logo o que ia acontecer na trama!
A sinopse não tinha me empolgado, mas sua resenha sim. 😀