Elfos, anões, orcs, trolls, dragões, wargs… E se eles existiram de verdade? E se tudo começou a desaparecer quando a Era dos Homens teve início? E se, ainda hoje, houver remanescentes desses seres entre nós?
Acompanhamos Tales, um filho de encantados, desvendando sua história envolta a uma trama secular: a luta pela sobrevivência de uma raça. Entre batalhas dos descendentes de alvores, a descoberta de existência de uma cidade inteira sob seus pés e a verdade por trás de vários fatos.
O leitor irá, junto com o protagonista, conhecer máquinas de guerra incríveis, personagens com habilidades curiosas, tramas e mistérios ocorrendo nas praças, terminais ou mesmo nas ruas onde passamos diariamente. De modo gradativo e embasado, trabalho para estreitar a fronteira entre a realidade e a fantasia no livro.
Fonte: Site da série Alvores
“O nome da cidade da superfície começou como uma brincadeira: ‘Khur-i-Tibah’ diziam os anões e repetiam os moradores, cujo termo significa ‘Khur de cima’. Depois de algum tempo, os habitantes gostaram da sonoridade e a palavra foi passando de boca a boca até se tornar Curitiba. Essa versão, a verdadeira, foi substituída pela mais aceitável, de ‘muitos pinheiros’ em tupi significa ‘kuri tiba’. No final das contas, é uma explicação plausível para esconder a participação dos Alvores na fundação da cidade, e é também a melhor escolha, inclusive para os anões.”
Descobri esse livro na Odisseia de Literatura Fantástica, assistindo uma palestra com o autor e cobiçando o exemplar lindo de amigos. A começar pela capa misteriosa, que cobre um miolo recheado de ilustrações. E, caso vocês não tenham sacado pela citação acima, a história se passa em Curitiba. EU AMO CURITIBA:
Como eu ia dizendo, é uma fantasia urbana em Curitiba. Pra quem não entende bem o conceito de fantasia urbana, isso quer dizer que:
- Se passa em um ambiente urbano (duhr) real/contemporâneo (nesse caso, Curitiba <3);
- Tem umas coisas bem loucas acontecendo (elfos, anões, orcs e umas misturas com humanos. Uns robôs gigantes a vapor. Umas lutas com robôs gigantes a vapor. Sangue de dragão. Bardos.);
- Os elementos fantásticos são intrínsecos ao cenário e sua relação com o cotidiano é relevante para o enredo.
Isso esclarecido, vamos ao enredo: o protagonista, Tales, é um rapaz de ascendência peculiar. Possui sangue élfico e humano em suas veias, o que o caracteriza como encantado. É entregue como aprendiz a Aer’delo, um elfo que o instrui nos conhecimentos Alvores – nome que define as raças mais antigas da Terra. Enquanto não está treinando arco-e-flecha ou estudando a Grande Guerra alvor que ocorreu em paralelo à Primeira e à Segunda Guerra Mundiais humanas, Tales passa seu tempo lendo… literatura fantástica! E me interrompo aqui para dizer que transparece a paixão do próprio autor por outras obras de fantasia: o livro é recheado de referências gostosas que vão de O Hobbit até Star Wars.
A trama começa durante uma missão em que Tales deveria apenas vigiar atividades suspeitas por parte dos mestiços – antagonistas históricos dos encantados, meio-orcs e meio-humanos – e acaba interferindo e sendo ferido. Ao voltar para o seu apartamento, depara com a ausência de seu mestre. E com um anão barbudo de jeans batendo à sua porta.
Mesmo com todo seu estudo, ele se surpreende ao descobrir que existe uma cidade de anões sob Curitiba. (Ao fazer essa descoberta junto com o protagonista, não pude deixar de pensar no clube de xadrez subterrâneo no Largo da Ordem. Vou ficar atenta para anões montados em motos maravilhosas da próxima vez que passar por lá.) A trama engrossa ao descobrirmos que as atividades dos mestiços envolviam o combustível para os Berserkers, máquinas que garantiram a derrota dos orcs e mestiços na Grande Guerra – não sem sacrifícios – e que há um Berserker em Curitiba, mas não sabemos exatamente onde, pois o falecido Rei Bur-Dair não revelou a localização da perigosa arma a ninguém. E os mestiços estão cobiçando-a.
Somos conduzidos pelo estilo leve de Kociuba pelo trajeto de Tales para impedir que o Berserker caia em mãos mestiças, que inclui cenas de luta bem cinematográficas. Esse trajeto é interrompido por interlúdios que contam fatos passados que fundamentaram os que são narrados no resto do livro, e que foram minha parte favorita da obra. A cada interlúdio o universo da série – sim, A liga dos artesãos é apenas o primeiro livro da série Alvores! – fica mais e mais rico, aprofundando também os carismáticos personagens. Gostei bastante dos costumes culturais descritos e do entrelaçamento de fatos históricos reais com os do livro, o que dá um aspecto retrofuturista à série. E eu quase não tenho uma queda pelo gênero.
O bacana deste livro é que, antes mesmo de ser lançado, muitas pessoas já acreditavam em sua qualidade. (Inclusive a Prefs de Curitiba!) Ele foi lançado de maneira independente, com captação de recursos via Catarse, no qual foram oferecidos prêmios criativos que incluíram uma estatueta, bonecos de feltro e cerveja artesanal. E sua execução foi muito bem-feita. As ilustrações que abrem cada capítulo são de autoria de Erike Miranda, cujo traço conduz a imaginação pela Curitiba reinventada por Kociuba. A diagramação é bem agradável e favoreceu uma leitura fluida, embora o texto em si possua alguns problemas de revisão – o que é perdoável em um projeto independente.
Há ainda conteúdo extra, que inclui uma lista de personagens – bem útil para aqueles que, como eu, têm problemas com nomes parecidos. Há também os agradecimentos do autor, a lista de todos que apoiaram o projeto no Catarse, uma nota sobre o ilustrador e o apêndice “Fantasia x Realidade”, que esclarece algumas das liberdades tomadas pelo autor.
Espero que em breve possamos ter em mãos os próximos volumes da série – para que eu possa passear mais um pouco por Curitiba, enquanto não puder voltar fisicamente para lá.
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A liga dos artesãos
Autor: Lauro Kociuba
Publicação independente
Ano de publicação: 2014
272 páginas
Bro-Thum e cliques cedidos por Enéias Tavares.
Citações favoritas
“Um antigo costume anão” respondeu Bro-Thum, enquanto mostrava seu próprio pulso direito com os elos marcados “Representa o nosso equivalente a um casamento. Quando duas pessoas entendem que se amam e precisam ficar juntas, o rei preside a cerimônia e abençoa a união com o aço e o fogo. Para nós, são os elementos que representam a estabilidade, confiança, vida e paixão. Com as mãos entrelaçadas, uma corrente de aço aquecida em brasa é fechada nos pulsos do casal, que mergulha as mãos em óleo frio. Assim temperam o aço, tornando-o mais forte. Nossa pele é muito resistente, em algumas horas a marca se cicatriza e podemos continuar com pelo menos três dias de celebração.
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“(…) Com o nível certo de som podemos desintegrar qualquer coisa, literalmente qualquer coisa. Mas isso é muito simples, o nosso objetivo é maior e mais complexo. Nós estudamos os elementos que compõe os seres humanos, hormônios, células, tecidos. E aprendemos a manipular esses elementos com notas musicais. Você nunca se sentiu extasiado com um cantor ou enfurecido com um solo de bateria?”
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“Guarde essa porcaria pra você; a dor me mantém alerta. Não posso renegar minha melhor professora.”