Sinopse:
Uma casa elegante, em uma região nobre, pega fogo diante dos olhos de seus moradores. Esse é o ponto de partida do segundo romance da renomada escritora Celeste Ng, que depois leva o leitor a acompanhar fascinado como os caminhos dos personagens se conectam até esse momento e a descobrir que pequenos incêndios por toda parte são capazes de criar um grande inferno. Um romance sobre as relações entre mães e filhos, e sobre os riscos de deixar as coisas por dizer.
Fonte: Intrínseca.
No papel, por Bárbara Prince
Quando uma casa inteira pega fogo no lindo bairro planejado de Shaker Heights, todos fofocam sobre a ideia de que a responsável pelo incêndio foi uma das moradoras da casa – Izzy, a filha mais nova dos Richardson. Mas para entendermos o que levou a esse incêndio (e a essa acusação), a autora Celeste Ng nos leva para alguns meses antes e nos apresenta a vida dessa família, e também de suas inquilinas, Mia e Pearl Warren.
Os Richardson são a perfeita família da propaganda de margarina, em versão americana: casa própria, universidades caras, filhos nos times esportivos na escola. Já Mia e sua filha Pearl têm estilo de vida e poder aquisitivo muito diferente do deles – Mia é artista e, sempre que precisa de novas inspirações, muda de cidade, ocasiões em que ela e Pearl levam consigo apenas o que couber no carro.
O atrito entre as visões de mundo dessas personagens dá conta de entregar ao leitor os pequenos incêndios prometidos no título. Esse é um romance sobre defeitos, erros e frustrações que as pessoas escondem (inclusive de si mesmas) para manter as aparências; a história me manteve presa às páginas com a mesma intensidade que o livro Até que a culpa nos separe, de Liane Moriarty.
Durante alguns capítulos iniciais, o livro parece quase um YA, enquanto acompanha a relação entre os adolescentes – Pearl e os quatro filhos da família Richardson. A história de seus interesses românticos e conflitos sociais vai expondo as gritantes diferenças econômicas e sociais à medida que Pearl tenta se encaixar com o grupo.
Mas esse contraste é apenas o primeiro desconforto apresentado pela autora. As muitas subtramas do livro abordam diversos outros assuntos polêmicos, especialmente relacionados à maternidade – os sacrifícios feitos por uma mãe, adoção, aborto e abandono. O ponto de vista varia entre as garotas e suas mães, e todas elas são mulheres muito reais e complexas.
Ng impressiona por sua habilidade de entrelaçar tantos temas ao mesmo tempo em que constrói suas personagens com habilidade e prende a atenção do leitor. Recomendo o livro para quem busca tramas impactantes e sem maniqueísmo.
Nas telas, por Gi Pausa Dramática
Primeiramente: muito obrigada a quem me recomendou essa série. Ela foi o meu refúgio em uma semana em que eu estava com mobilidade reduzida e com altas doses de analgésicos. Eu não li o livro, então assisti a série com olhar de novidade.
Assim como no livro, a série começa com o incêndio na casa dos Richardson e toda a trajetória dos episódios nos faz empatizar, pelo menos de leve, com a ideia de destruir o ostensivo patrimônio da família.
A primeira palavra que me ocorre ao pensar em Elena, a mãe da família, é performance. Ela faz um excelente trabalho gerindo a casa, a própria vida, seu trabalho de meio-período, a vida dos filhos, antecipando as necessidades do marido e garantindo que o bairro continue sendo o cenário ideal para os seus planos.
O que a leva a ligar para a polícia ao ver Mia e Pearl dormindo no carro, por achar que algo suspeito poderia acontecer em seguida.

Para mim, foi muito muito muito fácil detestar Elena; ela é a dona de casa esforçada para manter normas sociais que eu sequer tenho vontade de entender. Mia e Pearl estão mais próximas da minha realidade: uma família de duas pessoas bastante conectadas e com conflitos verossímeis. Elas vivem de maneira nômade, o que, a princípio parece ser só um efeito colateral de Mia ser uma artista. Mas quando a série revela magistralmente a história de quando ela engravidou de Pearl… fui assomada por uma onda de empatia.
Mas em algum ponto a série também consegue nos fazer entender as inseguranças de Elena, apesar da rivalidade explícita que se estabelece entre as duas protagonistas. E é muito legal que não sejam só as dificuldades da maternidade que me fizeram entender melhor a postura de Elena, mas também entender suas ambições.
Visualmente, a série é linda. Os figurinos são super bem trabalhados, em especial os de Pearl, que tem um arco super interessante ao ser influenciada por cada um dos irmãos Richardson. Quando comecei a assistir, pensei nela como uma mistura de Rory de Gilmore Girls (por amar ler e pela relação com a mãe) com Starr de O ódio que você semeia (por transitar bem entre os códigos sociais; a série inclusive não se furta a abordar o racismo).
Temos também tensões sobre imigração que me surpreenderam bastante, mas se encaixaram perfeitamente no restante das tramas e no tema geral de maternidade. E a representatividade LGBTQIAP+ inesperada!!!!! Foi muito muito legal ver as intimidades se construindo e as relações (e seus conflitos) ganhando novos significados.
Eu engoli a série em aproximadamente 3 dias e me fez feliz em vários níveis: trata os adolescentes e os adultos com igual complexidade, mostra pessoas tomando decisões questionáveis por amor não romântico, expõe as sutilezas das relações familiares. A produção é da empresa de Reese Witherspoon e eu diria que todos os envolvidos estão de parabéns.
Há adaptações no roteiro que podem frustrar quem gosta do final do livro, mas evitamos abordá-las para evitar spoilers. Para quem quiser dar uma olhada, eis um post em português que aborda essas diferenças 😀
Livro cedido em parceria com a Intrínseca.
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Pequenos incêndios por toda parte
Autora: Celeste Ng
Tradutora: Julia Sobral Campos
Editora: Intrínseca
Ano desta edição: 2018
416 páginas