[Resenha] Fool’s Errand

Essa resenha foi feita com base na edição da Bantam Books e contém spoilers para toda a Saga do Assassino e a trilogia Liveship Traders. A tradução de trechos foi feita por mim.

FoolsErrand-UKSinopse:

Por quinze anos, FitzChivalry Farseer viveu em um exílio autoimposto, presumido morto por quase todos que se importavam com ele. Mas agora visitantes começam a perturbar sua vida isolada: o mentor de Fitz de seus dias como assassino; uma bruxa que prevê o retorno de um amor há muito sumido; e o Bobo, o antigo Profeta Branco, que chama Fitz a cumprir o seu destino.

Fonte: Amazon

 

Se há uma grande lição que Robin Hobb nos ensina é: não empreste seu corpo para a consciência do seu tio ter uma última noite de paixão com a esposa antes de se transformar em um dragão. Não façam isso, crianças! O filho dessa união um dia vai perturbar a sua paz.

Começando pelo começo:

Fool’s Errand retoma a história do nosso querido Fitz, quinze anos após A fúria do assassino. Fitz ainda está morando em exílio com Nighteyes e Hap, o órfão que Starling deixou com ele e que agora já é um adolescente. A vida pacata e acomodada de Fitz, o qual só recebe as visitas de Starling (que é sua amante ocasional), é perturbada com uma visita de Chade. O antigo mentor (que você imaginaria já ser uma múmia a esta altura) quer que Fitz volte para a corte de Buckkeep ensinar o príncipe Dutiful (filho de Kettricken e “Verity”) a usar o Talento.

Fitz se recusa. Pouco tempo depois – quando ele já está começando a questionar a sua vida de ermitão – recebe outra visita do passado: o Bobo. Este voltou para Buckkeep sob o disfarce de “Lorde Golden”, um nobre afetado e podre de rico. Mas mesmo ele não consegue convencer Fitz a se mover. Ele só toma uma atitude quando o príncipe Dutiful desaparece misteriosamente – ninguém sabe se por vontade própria ou raptado. Chade, esperto como sempre, já se tocou que Fitz e o príncipe têm uma conexão pelo Talento, e espera que Fitz o ajude a encontrá-lo usando essa habilidade.

Mas o que Fitz descobre é uma intriga complicada que envolve aqueles do “Old Blood”, usuários da Wit (Manha), a magia animal. Pelo visto, o filho de seu corpo (mesmo que não de sua própria vontade…) tem a habilidade do pai de falar e se conectar com animais. O que complica bastante a vida de todo mundo, porque os Seis Ducados estão vivendo um momento tensíssimo de hostilidade contra pessoas com essa habilidade. Resgatar o príncipe se torna missão de Fitz (que agora adota o nome “Tom Badgerlock” e finge ser criado de Lorde Golden), do Bobo e de Laurel, a caçadora oficial da rainha, recrutada para a missão. (E, claro, de Nighteyes, que está velho para um lobo mas não vai ser deixado para trás.)

Acho que posso resumir esse livro com três palavras: SDDS TODO MUNDO. (Inclusive da Starling, brevemente, até ela se provar uma pessoa bem egoísta e manipuladora – mas não quero entrar em detalhes. Ugh.) Adorei o relacionamento de Fitz com Hap: ele reconhece que vai ter que deixar o garoto sair para o mundo e se tornar seu próprio homem, mas teme ficar sem o menino a quem se afeiçoou tanto. Também está assustado com a condição deteriorante de Nighteyes, e não suporta pensar em viver sem o lobo (eu também não).

Há duas mulheres novas em cena: Jinna, uma bruxa que faz uns amuletos loucos e vira amiga de Fitz, e Laurel, que, como disse, é a caçadora da rainha Kettricken (a qual infelizmente quase não aparece no livro, embora seu reencontro com Fitz seja bem fofo). Laurel ajuda Fitz e o Bobo na missão de recuperar o rapaz, e cria uma relação complicada e de suspeita com Fitz. Espero vê-la de novo nos próximos livros; ela tem bastante potencial para crescer.

Chade, por sua vez, se não é literalmente uma múmia, certamente está em declínio. É bem melancólico para Fitz perceber que seu antigo mentor já não é tão seguro de si quanto antes, assim como as mudanças que ocorreram em Buckkeep na sua longa ausência. A cidade cresceu, e Fitz Chivalry Farseer não é sequer uma lembrança para a maioria daqueles que um dia o conheceram.

Preciso admitir que a trama desse livro não me agradou tanto quanto as da Saga do Assassino. Talvez porque Dutiful seja um adolescente insuportável por boa parte do livro – o que não é bem culpa dele; mesmo assim, não aguentava mais ouvi-lo reclamar enquanto os outros tentavam salvá-lo. Quando cheguei ao final do livro, fiquei bem aliviada por essa trama ter acabado – e esperamos que ele melhore a partir de agora. Porém, tenho que dizer que é hilário ver Fitz se frustrando com o príncipe e suas decisões imprudentes e jeito teimoso, e se perguntando se ele mesmo “já foi jovem desse jeito”. Fitz. Querido. Sim. Você era o pior adolescente.

Por outro lado, o reencontro com o Bobo retoma um dos relacionamentos centrais da série. E é lindo. Quer dizer: “No espaço de um pôr do sol, você me mostra o mundo das costas de um cavalo, e a alma do mundo dentro das minhas próprias paredes”? FITZ, QUE QUE É ISSO, MANO. Pra alguém que não sacou que seu melhor amigo é apaixonado por você, você é bem romântico com ele. Enfim, o Bobo caracteristicamente revela bem pouco sobre o que vem fazendo nos últimos anos (cof, nenhuma menção a Paragon…), mas Fitz lhe conta bastante sobre a sua vida – o que torna o começo do livro um pouco lento, até a ação começar de fato. E, se no começo a história de Fitz servir como criado dele era bem engraçada, depois fui ficando – assim como Fitz – cansada de eles não poderem falar abertamente.

De todo modo, eu sempre adoro quando os dois estão juntos (meu livro está cheio de coraçõeszinhos nas margens, porque eu sou dessas), e ver o Bobo encomendando várias roupas elegantes (e bem apertadas) pro Fitz já valeu a farsa. Vê-los trabalhando juntos é ótimo porque o Bobo naturalmente se adapta a qualquer circunstância e faz o seu papel com perfeição, enquanto o Fitz tem que se controlar pra não acabar com o disfarce e sair por aí batendo em pessoas que olham enviesado pra ele. E claro que Fitz “Traumas de Infância” Farseer continua suspeitando até da própria sombra, mas o Bobo ainda é a coisa mais próxima de uma pessoa em quem ele confia. Fitz também continua um defensor ferrenho da técnica da Negação e é deliberadamente obtuso sobre os sentimentos do Bobo em relação a ele. Da minha parte, só dor e sofrimento.

E é preciso mencionar que o Bobo e Nighteyes continuam se amando e respeitando mutuamente, o que é lindo. E falando em Nighteyes – que continua um personagem maravilhoso, corajoso e sábio (MELHOR LOBO) –, Fitz também ganha um cavalo novo. Mais especificamente, um cavalo negro, que ele com muita criatividade chama de “Myblack”. Troféu para este homem.

E ainda sobre animais, um grande tema do livro pode ser descrito como amantes de gatos versus amantes de cachorros, porque Fitz vai para uma região em que as pessoas caçam com gatos selvagens – e os que têm a habilidade formam conexões com eles. Pela primeira vez, ele tem uma chance de conversar com gatos, o que é ótimo, porque eles geralmente dão ordens como “Me pegue!” ou “Faça um colo pra mim!” ou simplesmente anunciam “Estou subindo!”. Claramente a questão da Manha será um grande tema da trilogia, e a perseguição contra essas pessoas é bem violenta e triste. Parte dela, inclusive, pode ser remetida às ações de Regal, o que te lembra de como você odiava aquele cara.

Ah! E há várias referências a Liveship Traders, mesmo que não tantas quanto eu gostaria (quase nada é dito sobre os dragões!). Uma “homenagem”, em especial, me fez rir alto; enquanto a visita a um lugar específico me deixou em choque. Pra não mencionar a resposta a um mistério menor que quase passou batido no meio de toda a animação daquela trilogia. Pela quarta capa do próximo livro, sei que vamos ter mais referências a essa trilogia. Estou animadíssima!

O livro é bem tenso, um forte começo para a trilogia, e os últimos capítulos são difíceis de largar. Pera, quem eu tô enganando? O livro inteiro é difícil de largar. Apesar das ressalvas, Hobb continua excelente. Sua escrita é meu novo padrão de excelência, e rever Fitz e o Bobo e outros conhecidos me fez pensar que não quero nunca sair desse mundo. Resenha do próximo semana que vem!

*

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Fool’s Errand
Autora: Robin Hobb
Editora: Bantam Books
Ano de publicação: 2002
662 páginas

*

Resenhas da série Realm of the Elderlings:

Trilogia Farseer/Saga do Assassino: O aprendiz de assassinoO assassino do reiA fúria do assassino

Trilogia Liveship Traders: Ship of MagicMad ShipShip of Destiny

Trilogia The Tawny Man: Fool’s ErrandGolden FoolFool’s Fate

Rain Wild Chronicles: Dragon KeeperDragon Haven – City of Dragons – Blood of Dragons

Trilogia The Fitz and the Fool: Fool’s AssassinFool’s Quest

 

Citações preferidas

Às vezes eu penso que a Manha é mais maldição que dádiva. Talvez a parte mais difícil de a possuir é testemunhar tão completamente a crueldade casual dos humanos. Alguns falam da selvageria das bestas. Eu sempre a preferirei ao desdém irrefletido que alguns homens têm para com os animais.

*

Há uma vaidade monstruosa no orgulho que temos dos nossos filhos, eu disse a mim mesmo. Eu tinha tropeçado pelo caminho com Hap, nunca pensando muito a respeito do que estava ou não o ensinando sobre ser um homem. Então, uma noite, um jovem rapaz olha para mim e me diz que sabe se virar sozinho se precisar, e eu sinto o rubor do sucesso. O garoto tinha se criado sozinho, eu disse a mim mesmo, mas ainda estava sorrindo quando adormeci.

*

“Pela sua mão esquerda, eu diria que você teve um amor doce e verdadeiro em sua curta vida. Um amor que terminou apenas com a sua morte. Mas aqui, na sua mão direita, vejo um amor que vai e vem por todos os seus muitos anos. Esse coração fiel tem estado ausente por um tempo, mas logo voltará para o seu lado.”

*

O cavaleiro era inteiramente digno do cavalo. […] Sua pele era cor de ouro beijado pelo sol, assim como seu cabelo, e seus traços eram delicados. O homem dourado se aproximou silenciosamente exceto pelas batidas rítmicas dos cascos do cavalo. Quando se aproximou, parou a criatura com um toque, e ficou sentado olhando para mim com olhos de âmbar. Ele sorriu.

Algo revirou em meu coração.

*

A verdade, eu descobri, é uma árvore que cresce à medida que um homem ganha acesso à experiência. Uma criança vê a bolota de sua vida diária, mas um homem olha para trás e vê o carvalho.

*

Nenhum homem pode voltar a ser garoto. Mas há interlúdios na sua vida quando, por um tempo, ele pode recapturar o sentimento de que o mundo é um lugar generoso e que ele é imortal. Eu sempre acreditei que essa era a essência da infância: acreditar que os erros não pudessem ser fatais.

*

Você devia parar de farejar a carcaça da sua antiga vida, meu irmão. Talvez goste de dor eterna. Eu não. Não há vergonha em abandonar ossos, Catalisador. Ele finalmente virou a cabeça para me encarar com olhos profundos. Nem há nenhuma sabedoria especial em se machucar vez após vez. Qual é a sua lealdade para essa dor? Abandoná-la não vai diminui-lo.

*

“Como eles podem ser tão cegos?”

Ele balançou a cabeça e sorriu com a minha ignorância. “Fitz, Fitz. Eles nunca me viram, pra começo de conversa. Eles viam apenas um palhaço e uma aberração. Eu deliberadamente não adotei nenhum nome quando cheguei aqui pela primeira vez. Para a maioria dos senhores e senhoras de Buckkeep, eu era apenas o Bobo. Eles ouviam minhas piadas e viam minhas cambalhotas, mas nunca realmente me viram.” Ele deu um suspiro curto. Então me deu um olhar pensativo. “Você transformou isso num nome. O Bobo. E me viu. Encontrou meus olhos quando os outros desviavam o olhar, desconcertados.”

*

Eu me preparei e saí na chuva torrencial. Estava tão frio e desagradável quanto eu esperava. […] Então respirei fundo e decididamente mudei minhas expectativas. Como Black Rolf tinha me falado uma vez, grande parte do desconforto é baseado em expectativas humanas. Como um homem, eu esperava estar aquecido e seco quando escolhesse. Os animais não tinham quaisquer crenças desse tipo.

*

“A morte é sempre menos dolorosa e mais fácil que a vida! É verdade. Apesar disso, dia a dia, nós não escolhemos a morte. Porque, no fim, a morte não é o oposto da vida, mas o oposto da escolha. A morte é o que resta quando não há mais escolhas a serem feitas.”

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